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Ostra nasce do lodo

Achei que não fosse conseguir escrever o meu texto sagrado sobre a minha mais recente revolução solar, praticamente não escrevo mais fora das linhas da minha cabeça. Teve tudo aquilo do que não consegui escapar. Fiquei triste de verdade, sinto que fui encolhendo e não consegui mais voltar a escrever, porque as ideias ficavam soltas, raivosas umas com as outras, sem a possibilidade de definir o que é, exatamente, o que eu vou dar como encerrado nas minhas ruminações. Receio que eu tenha me encontrado com assuntos de um outro eu, e me fere profundamente, porque o amor é o que se faz, não o que se fala. 

Completei o último dos vinte e anos. Na última vez que estive aqui cumprindo esse ritual, desejei que o que viesse, não gerasse tumulto. Sinto que fui ingênua com o meu otimismo, porque passei o meu último ano enfrentando bestas enormes do meu passado. Andei tanto em círculos que cavei um fundo do poço, paguei o aluguel mais caro do mundo; depois realizei que mereço mais, juntei as minhas coisas e fui ser feliz onde posso amar e ser amada pra caralho. 

Das coisas que precisei admitir é que, as vezes, é preciso saber a hora de largar o osso. Quase nunca sei, torço tanto pelo amor que existe porque sim, porque aceita toda a minha pluralidade e deseja construir comunidade comigo, que me perco, abro as portas do meu coração e pulo para fora dele, 'vai, entra, mi casa su casa', acabo ficando trancada para fora. Se o que importa é o que eu faço do que fizeram de mim, nesses vinte e nove anseio pelo encerramento de feridas que ficaram abertas tempo demais, pelo cessar de insistências que não fazem sentido e me livrar da mágoa. 

No mais, sigo um pouco feliz. Ando cansada, compreendendo que chacoalhei as estruturas da minha vida e me mudei de lugares de grande insuficiência. Ajeito o apartamento novo como quem ajeita a cabeça e a vida, sem pressa e sem pausa. Se vale o registro, morri por dentro e estou nascendo do lodo. 

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